Boas práticas nas ciclovias e ciclofaixas de São Paulo

São Paulo, cidade que conta com cerca de 11,4 milhões de habitantes1, tem um desafio importante de garantir que todos eles consigam se deslocar para suas atividades de trabalho, estudos, lazer, saúde, dentre outras.

O que se mostra na prática são grandes quilômetros de trânsito, em especial nos horários de pico, sendo o maior causador o excesso de automóveis, veículos que ocupam muito espaço da via para levar na maioria das vezes uma única pessoa.

Uma das principais soluções de mobilidade para contornar o trânsito causado pelos automóveis é a bicicleta. Nesse sentido, com o avanço da estrutura cicloviária pela cidade, regiões como a Av. Brigadeiro Faria Lima contam com um alto fluxo de usuários da ciclovia, muitos deles com equipamentos providos de alguma forma de motor elétrico.

Especificamente pelo alto fluxo de pessoas ocupando a ciclovia dessa região que começam a surgir conflitos devido ao uso imprudente do espaço. A partir disso, resolvi elaborar um manual de boas práticas para quando você estiver em uma ciclovia movimentada com base nos meus 10 anos como ciclista ativo na cidade.

Noções básicas

As ciclovias são espaços compartilhados em que os usuários precisam interagir, para além dos ciclistas, com pedestres, patinetes, monociclos, bicicletas elétricas e demais equipamentos de mobilidade individual.

Além disso, uma premissa importante para considerar quando você está sobre rodas é que os pedestres são completamente imprevisíveis e negligentes, fazem o que querem e nem sempre estão prestando atenção no entorno, mas continuam sendo o elo mais fraco do trânsito e é dever de todos protegê-los.

Dessa forma, ao transitar em uma ciclovia, é necessário estar atento a tudo que estiver acontecendo. Se tiver pedestres, se afaste e diminua a velocidade, independente de “quem está certo”.

Posicionamento e ultrapassagem

Existem diversos tipos de ciclovias e ciclofaixas, uma das mais seguras é justamente aquela de mão dupla que se posiciona geralmente nos canteiros centrais de grandes avenidas. Nesses casos, é muito importante que você sempre se posicione o mais a direita possível de forma que consiga trafegar com segurança e ainda possibilitar que indivíduos que estejam andando mais rápido que você ultrapassem com segurança.

Já em relação a ultrapassagem, é essencial se atentar ao fluxo da via e realizar a ultrapassagem apenas quando for realmente seguro de realizar tal manobra. Algo que vejo diariamente são equipamentos motorizados andando em velocidade incompatível com a via e forçando ultrapassagens com outros ciclistas vindo no contrafluxo, inclusive já presenciei acidentes por conta dessas imprudências. Se você já está utilizando um equipamento motorizado, não pode esperar alguns segundos no seu trajeto para garantir a segurança de todos?

Sentido da via

Por mais que o maior fluxo de ciclistas costume ocorrer em ciclovias de canteiro central, algumas vias como a Avenida Rebouças possuem ciclofaixas de mão única separadas para cada sentido da via.

A principal característica dessas ciclofaixas de canteiro central é o seu tamanho reduzindo, que não permite que duas bicicletas fiquem lado a lado em segurança. Nesses casos, é de extrema importância observar o sentido correto de circulação da ciclofaixa e NÃO ANDAR NO CONTRAFLUXO, uma vez que não é possível desviar com segurança de outro ciclista que esteja trafegando no sentido contrário.

Velocidade

Em algum momento as redes sociais popularizaram um conceito de que a velocidade máxima para trafegar em um ciclovia seria de 25km/h e ainda atribuíram esse informação ao Código de Trânsito Brasileiro (CTB).

No entanto, o CTB não dispõe em nenhum dos seus artigos e definições sobre velocidades de ciclovias, cabendo individualmente aos órgãos de trânsito essa regulamentação, algo que a maioria das cidades não tem velocidade definida, incluindo São Paulo.

Mesmo que não haja um limite expresso na legislação, é muito importante utilizar o bom senso ao utilizar esses espaços compartilhados, principalmente quando o fluxo de usuários estiver mais intenso. Uma velocidade de 25 a 30km/h é razoável para trafegar em ciclovias, mais do que isso, recomendo apenas para as situações em que elas estiverem vazias e com pouco fluxo de pedestres ao redor.

Sua pressa não justifica andar em velocidade incompatível com a segurança de todos.

Cruzamentos

Por mais que as ciclovias sejam isoladas do tráfego dos automóveis, nos pontos de cruzamento é inevitável compartilhar curtos espaços da via com demais automóveis e pedestres.

Infelizmente, nem todos os cruzamentos são sinalizados de maneira adequada e boa parte deles só tem sinalização semafórica para os automóveis. Dessa forma, é muito importante sempre diminuir a velocidade e perceber a movimentação dos carros de modo a ter certeza que não vão passar pelo cruzamento no mesmo momento que você tiver atravessando.

Além disso, respeitar os semáforos, quando eles estão presentes, é essencial para garantir a segurança de todos, principalmente dos pedestres, não é porque não está vindo carro que você pode varar o sinal vermelho.

Calçadas

O CTB não permite o tráfego de bicicleta e equipamentos de mobilidade nas calçadas, no entanto, algumas vias são muito precárias e a forma mais segura de trafegar por certos trechos, principalmente no contrafluxo, é por meio das calçadas.

Quando optar por utilizá-las, é essencial manter uma velocidade baixa e respeitar os pedestres. Eles não tem obrigação nenhuma de “dar passagem”.

Ciclofaixas de lazer

Por fim, as ciclofaixas de lazer que acontecem em São Paulo nos domingos e feriados consistem em faixas de carros reservadas para os ciclistas por um período de tempo delimitado, mas com foco em lazer e não treino/deslocamento.

Dessa forma, geralmente é frequentada por pessoas em baixa velocidade, inclusive com crianças e idosos, sendo essencial respeitá-los e não tentar utilizar como ferramenta de treino cortando todos de maneira arriscada. Como o foco é lazer, geralmente são ciclistas inexperientes que estão trafegando e podem acabar fazendo movimentos imprevisíveis colocando todos em risco caso passe em velocidade incompatível.

Conclusão

Se você se atentar as noções básicas e se pautar pelo respeito, procurando sempre compartilhar os espaços urbanos, você será um ótimo ciclista e fará um uso adequado das estruturas cicloviárias da cidade. O elemento principal é lembrar que você convive em sociedade e seus direitos não estão acima dos demais usuários.

  1. https://www.ibge.gov.br/cidades-e-estados/sp/sao-paulo.html ↩︎

Review da Ella, a bicicleta elétrica da Moura

Expectativas da compra

Essa semana adquiri minha mais nova bicicleta, uma Bicicleta Elétrica do grupo Moura. Lançada em 2024, a Moura trouxe uma proposta de atendimento premium para alinhar a expertise de baterias do grupo com uma nova solução de mobilidade urbana para cidades como São Paulo através da bicicleta elétrica Ella1

Eu sempre pensei em adquirir uma bicicleta elétrica pois costumo fazer deslocamentos acima de 10km na cidade para o trabalho e faculdade. Como esses deslocamentos costumam ser feitos em horário de pico, andar de carro é caro e frustrante por causa do trânsito, andar de trem/metrô é insuportavelmente cheio e andar de ônibus é cheio e demorado, abrindo espaço para meu modal de transporte favorito: a bicicleta!

Por mais que eu ame pedalar, se deslocar diariamente para distâncias acima de 10km, tendo que levar uma mochila pesada com notebook e troca de roupa é algo que pode ser bem desgastante.

Foi então que, analisando todos os prós e contras, decidi pela bicicleta elétrica, em especial a Moura Ella. Os principais pontos que me levaram a comprar ela estão listados abaixo:

Atendimento

O atendimento que o grupo Moura está oferecendo para o pré e pós vendas é simplesmente incrível, experiência completamente diferente do que encontro em outras marcas.

  • Eles tem um atendimento centralizado no whatsapp onde você fala com um humano e não um robô;
  • Se você mora nas regiões atendidas (basicamente São Paulo), eles te proporcionam um test ride completamente gratuito em que eles agendam e levam a bicicleta até o seu endereço e deixam você testar ela livremente pela região2;
  • Por mais que a fabricação da bicicleta seja feita na China, a Moura faz um rigoroso controle de qualidade antes de enviar para o consumidor final, além de oferecer um ano de garantia, enquanto as concorrentes oferecem normalmente de 3 a 6 meses;

Qualidade da construção

Por mais que a bicicleta não seja fabricada no Brasil, a Moura se preocupou em concretizar um projeto de qualidade. O quadro é inteiro de alumínio, tamanho único mas com uma composição de canote, selim e mesa que atende os mais variados tamanhos. Eu particularmente meço 174,5cm de altura e achei ela super confortável durante o teste.

Além disso, os componentes como rodas, pneus, câmbio, freios, etc são de alta qualidade, com destaque especial ao freio a disco hidráulico da Shimano e um Câmbio Altus de 8 velocidades.

Autonomia

Em dezembro de 2024, ano do lançamento da bicicleta, a Moura divulgava uma autonomia de 100km com uma carga completa de bateria, chegou inclusive a fazer publicidade junto no canal Manual do Mundo3 com essa informação.

Quando eu entrei em contato novamente com eles, em março de 2025, a informação oficial de autonomia mudou de 100km para 80km com uma carga. Fizeram essa alteração justamente para ficar mais fiel ao rendimento real da bateria.

Essa quilometragem prometida, mesmo os 80km, costuma ser maior do que a maior parte das concorrentes e, com certeza está aliada a construção de uma bicicleta leve (na medida do possível para bicicletas elétricas que são pesadas por natureza) com um motor na medida certa (350W), nem muito forte (não consome tanta energia), nem muito fraco (suficiente para encarar qualquer subida de São Paulo com pouco esforço).

Primeiras impressões como proprietário

Explicado o contexto da minha expectativa, vamos às primeiras impressões quando finalmente recebi ela em casa:

Entrega

A entrega foi com horário agendado e foi super rápido, tinham data disponível na mesma semana. A bicicleta vem completamente montada, lubrificada e com a bateria parcialmente carregada.

Além disso, o pagamento é feito na hora em até 18x sem juros no cartão de crédito.4

Bicicleta e seus acessórios

Conforme comentado anteriormente, a bicicleta vem completamente equipada com paralamas, bagageiros, refletores e iluminação integrada diretamente na bateria. Além disso, algo que me surpreendeu foi uma bolsa de tecido contendo:

  • Carregador da bateria;
  • Duas chaves para remover a bateria do quadro;
  • Ferramentas para reparos básicos;
  • Um separador de pastilha de freio para evitar que as pastilhas colem caso precise tirar a roda da frente; e
  • Um manual detalhado da bicicleta.

Carga inicial e primeiro pedal com ela

A regulagem padrão que entregaram ela não parece estar muito adequada para minha posição, mas isso é um ajuste fino que é simples de fazer e não tinha como eles saberem antes…

Fora isso, a bateria veio carregada mais da metade, precisando de aproximadamente 4 horas para atingir a recarga completa e sair para o primeiro teste.

Fiz o carregamento com a bateria fora do quadro, conforme orientado pelo manual. A bateria em si não esquenta, mas a fonte do carregador esquenta bastante.

Logo no meu primeiro teste, não quis simplesmente usar o maior nível de assistência, pelo contrário, queria descobrir qual era o mínimo confortável para usar, pensando num cenário de preservação máxima da autonomia.

Já na minha primeira ida ao trabalho com ela, cerca de 11km, ela apresentou um erro no visor no meio do trajeto, mas continuou operando o motor normalmente, além disso, na ida usei em praticamente todo o trecho o nível um de assistência, e na volta resolvi testar ela na subida da Avenida Rebouças para ver se ela aguenta o tranco.

Na Av. Rebouças, precisei usar a assistência máxima para manter uma velocidade acima de 20km/h e nesse momento vi o mostrador de bateria sugando toda energia por conta do esforço, até me assustei. Quando finalizou a subida e voltei a usar uma assistência mais baixa, o indicador de bateria aumentou, ou seja, aparentemente não da para usar muito o nível 3 de assistência, o que é uma pena se você tiver uma subida mais íngreme no trajeto.

De modo geral, percebi que preciso fazer alguns ajustes de ergonomia nela e testar a autonomia máxima no uso dos trajetos diários, mas hoje ela está com aproximadamente 70% da carga com cerca de 34km rodados.

Dados após o primeiro deslocamento.

Conclusão

A bicicleta elétrica Ella do grupo Moura a princípio é uma ótima opção que veio para somar na mobilidade urbana dos paulistanos. Com uma boa construção e um atendimento de qualidade, espero que seja uma boa aposta a médio/longo prazo.

Por fim, essa é uma avaliação com um dia de uso, muita coisa ainda pode mudar, tanto para melhor quanto para pior. Daqui 6 meses (ou menos) volto para fazer uma segunda avaliação mais detalhada sobre a experiência com ella.

  1. https://www.ebikeella.com.br/ ↩︎
  2. Teste realizado em março de 2025, é possível que eles mudem o procedimento em algum momento. ↩︎
  3. https://youtu.be/n9ryP76mvyc?si=Jguzycj5UwleWUsQ ↩︎
  4. Condição comercial de Abril de 2025. ↩︎

Bicicleta elétrica tem acelerador?

Cada vez mais vemos nos grandes centros urbanos a necessidade de alternativas sustentáveis, baratas e que diminuam os tempos de deslocamento. Nessa perspectiva surgem diversos produtos motorizados com objetivo de facilitar essa movimentação urbana sem o ônus do esforço de utilizar uma bicicleta.

Dentre essas alternativas, se destacam as bicicletas elétricas e os equipamentos de mobilidade individual autopropelidos. Importante pontuar a diferença entre elas pois, para efeitos de direitos e deveres, apenas a bicicleta elétrica se iguala a bicicleta, enquanto os equipamentos de mobilidade individual autopropelidos possuem regras próprias que serão abordadas adiante.

Algo que se popularizou foi a noção de que uma bicicleta elétrica seria qualquer coisa que tenha visual característico de uma bicicleta, só que com um motor elétrico, concepção errônea quando analisada pelas normas do direito de trânsito brasileiro.

Mas afinal, o que é uma bicicleta elétrica? De acordo com a resolução nº 996/2023 do CONTRAN1 bicicleta elétrica é um veículo de propulsão humana com duas rodas que deve conter as seguintes características: (a) possuir um motor auxiliar para propulsão que tenha potência máxima de 1000W; (b) o funcionamento deste motor auxilia apenas quando o condutor pedalar, recurso conhecido como “pedal assistido”; (c) não dispor de acelerador ou qualquer dispositivo de variação manual de potência; (d) o auxílio prestado pelo motor na propulsão não pode ser superior a 32km/h.

A partir da definição jurídica de bicicleta elétrica, fica claro que se tem acelerador, não é bicicleta! A mesma resolução define outros modais sendo eles o equipamento de mobilidade individual autopropelido; ciclomotor; motoneta; e motocicleta.

A definição do equipamento de mobilidade individual autopropelido é similar a definição de bicicleta elétrica, também tendo limitação de 1000W de potência nominal máxima do motor e velocidade máxima de atuação do motor de 32km/h, no entanto a a principal diferença é que o motor deixa de ser auxiliar e passa a ser diretamente responsável pela movimentação através do uso de algum tipo de acelerador.

É especialmente importante essa limitação de potência e velocidade no caso dos autopropelidos porque caso ultrapassem o regulamentado, podem se enquadrar como ciclomotor, motoneta ou motocicleta o que resultaria na obrigatoriedade do licenciamento, assim como traria a necessidade do condutor possuir carteira de habilitação com Autorização para Conduzir Ciclomotores (ACC) ou categoria A.

Bicicleta elétrica x equipamento de mobilidade individual autopropelido

Definido as diferenças de classificação técnica entre a bicicleta elétrica e os autopropelidos, o que difere na prática as duas modalidades? Onde cada um pode transitar? Quais suas limitações?

Para responder essas perguntas faço novamente uma análise da resolução nº 996/2023 do CONTRAN em conjunto com dispositivos do Código de Trânsito Brasileiro (CTB)2. De acordo com o Art. 2º §1º da resolução, apenas a bicicleta elétrica equipara-se à bicicleta. Nesse sentido, elas tem os mesmos direitos que estão regulamentados expressamente no CTB, como por exemplo o de circular na pista de rolamento:

Art. 58. Nas vias urbanas e nas rurais de pista dupla, a circulação de bicicletas deverá ocorrer, quando não houver ciclovia, ciclofaixa, ou acostamento, ou quando não for possível a utilização destes, nos bordos da pista de rolamento, no mesmo sentido de circulação regulamentado para a via, com preferência sobre os veículos automotores.

Justamente por causa dessa equiparação, diferentemente dos equipamentos de mobilidade individual autopropelidos, a bicicleta elétrica é considerada um veículo, contendo todos os seus direitos e deveres, podendo transitar junto com os outros veículos, em qualquer pista de rolamento que não tenha proibição expressa contrária.

Por mais que o CONTRAN tenha especificado que cabe ao órgão de trânsito local regular a o deslocamento desses modais, é de conhecimento geral que não é prioridade para os municípios que, mesmo quando regulamentam, falham na fiscalização. Para fins práticos, os autopropelidos que não ultrapassem a velocidade e potência definidos na Resolução nº 996/2023 podem andar apenas nas ciclovias e em vias de até 40km/h, enquanto as bicicletas elétricas podem trafegar em qualquer via que não seja expressamente proibida.

Essa diferença é relevante quando consideramos que a velocidade da maioria das avenidas da cidade de São Paulo é de 50km/h, dessa forma, os únicos modais que poderiam trafegar nesses locais na ausência de ciclovias seriam as bicicletas e bicicletas elétricas, com exceção de alguma regulamentação específica por parte dos órgãos de trânsito locais.

Por fim, caso você esteja pensando em adquirir um desses modais de transporte, lembre-se que as ciclovias são locais compartilhados e é dever de todos contribuir com a segurança trafegando em velocidade compatível, prestando atenção adicional aos pedestres e veículos não motorizados.

  1. https://www.gov.br/transportes/pt-br/assuntos/transito/conteudo-contran/resolucoes/Resolucao9962023.pdf ↩︎
  2. https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L9503Compilado.htm ↩︎